22. O que são os Gnósticos?

O termo “gnóstico” vem da palavra grega “gnosis” que significa conhecimento. O gnóstico é, portanto, aquele que adquire um conhecimento especial e vive segundo ele. “Gnose” não tem um sentido pejorativo. Alguns Santos Padres como Clemente de Alexandria e Santo Ireneu falam da gnose como o conhecimento de Jesus Cristo obtido pela fé: “a verdadeira gnose – escreve Santo Ireneu – é a doutrina dos Apóstolos” (Adv. Haer. IV, 33)

O termo “gnóstico” adquiriu um sentido pejorativo depois de aplicado pelos mesmos Padres a certos hereges que tiveram um notável relevo entre os séculos II e IV. O primeiro a designá-los assim foi Santo Ireneu, que vê a sua origem na heresia de Simão, o Samaritano (Act 8, 9-24), dizendo que os seus seguidores se propagaram pela Alexandria, a Ásia Menor e Roma, dando lugar a “uma multidão de gnósticos que emergem do chão como se de fungos se tratassem” (Adv. Haer. 1, 29.1). Deles, continua Santo Ireneu, derivam os valentinianos que são os que combate directamente. Explica tal abundância e diversidade de seitas dizendo que “a maioria dos seus inventores – de facto, todos – querem ser mestres; abandonam a seita que abraçaram e urdem um ensino a partir de outra doutrina, e a partir de esta surge mais outra, mas todos insistem em ser originais e em terem feito por si mesmos as doutrinas que se limitaram a compilar” (Adv. Haer. 1.28.1).

Destas informações de Ireneu e de outros Padres que também combateram aqueles hereges (especial­mente Santo Hipólito de Roma e Santo Epifânio de Salamina), deduz-se que foi tal a quantidade de grupos (simonianos, nicolaítas, ofitas, naasenos, setianos, peratas, basilidianos, carpocratianos, valen­tinianos, marcosianos) e mestres (Simão, Cerinto, Basílides, Carpócrates, Cerdão, Valentim, Ptolomeu, Teódoto, Heracleão, Bardesanes…) que foram designados “gnósticos”, embora só de um modo muito genérico se possam agrupar numa mesma classificação. De todas as obras heréticas “gnósticas” descobertas em 1945 em Nag Hammadi (Alto Egipto) – cerca de quarenta – fica-se com uma impressão parecida: cada obra contém a sua própria orientação doutrinal herética.

Dentro desta diversidade, os melhor conhecidos são os gnósticos valentinianos, e também os que mais influência exerceram. Actuavam dentro da Igreja como uma “fera oculta” diz Santo Ireneu. Tinham as mesmas Escrituras Sagradas que a Igreja, mas interpretavam-nas num sentido contrário. O Deus verdadeiro, segundo eles, não era o Criador do Antigo Testamento; distinguiam diversos Cristos entre os seres do mundo celeste (eões); afirmavam que a salvação se obtinha pelo conhecimento de si mesmo como chispa divina presa na matéria; que a redenção de Cristo consistiria em despertar para esse conhecimento; e que só os homens espirituais (pneumatikoi) estariam destinados à salvação. O carácter elitista desta seita e o desprezo pelo mundo criado configuravam, entre outros traços, a menta­lidade daqueles herejes, represen­tantes mais signifi­cativos dos “gnósticos”.

 

Bibliografia: Raymond Kuntzmann - Jean-Daniel Dubois, Nag Hammadi. Evangelio de Tomás. Textos gnósticos de los orígenes del cristianismo, Verbo Divino, Estella 1998 (oferece uma apresentação simples e bastante completa de toda a Biblioteca Nag Hammadi).

Gonzalo Aranda