O meu testemunho

D. Alberto, Bispo Emérito de Leiria-Fátima, escreveu este artigo na Voz Portucalense, a propósito do centenário do nascimento do Beato Josemaría Escrivá.

Da riquíssima personalidade humana e cristã do Beato Josemaría selecciono o seu amor à liberdade. Conheci-o pessoalmente em Roma no Outono de 1964, quando, como Padre Conciliar me desloquei à Cidade Eterna. Lembro-me como se fosse hoje. Estava rodeado dum pequeno grupo de filhos seus: leigos e sacerdotes.

Em dado momento fala da liberdade. Nunca ninguém assim falara: a liberdade como direito e como dever. Liberdade que devemos defender: a nossa e a dos outros. A vibração e o entusiasmo das suas palavras quase chegavam a escandalizar. No decorrer do tempo e à medida que ia aprofundando os seus ensinamentos, pude descobrir a maravilha que é a liberdade dos filhos de Deus. A liberdade reclama um vivo sentido de responsabilidade, sob pena de se converter em libertinagem que é porta aberta para todos os vícios.

Se pensarmos bem, chegamos à conclusão de que a liberdade é fruto da Cruz; foi pelo poder do sacrifício da Calvário que Jesus nos fez livres, para amar; ele não quer "respostas forçadas mas sim decisões que saiam da intimidade do coração" (Cfr. Josemaría Escrvá, Cristo que passa, n.º 100); esta liberdade de amar a Deus e n´Ele e por Ele todos os homens é fonte de uma alegria inefável que nada nem ninguém nos pode arrebatar; a liberdade dá asas para voarmos como as águias, faz-nos capazes de conquistar o destino eterno que o Senhor nos assinalou: o melhor exercício da liberdade consiste em fazer a vontade de Deus. (Vêmo-lo claramente na resposta de Maria À mensagem celeste: "faça-se") também o Beato Josemaría Escrivá queria ser simplesmente instrumento que sempre e em tudo procura fazer a vontade divina.

Visto que a liberdade nos foi conquistada por Cristo de uma vez por todas devemos defendê-la e mostrá-la em qualquer ambiente, com valentia e audácia; jamais vacilaremos perante o que dirão; ouvimos falar de respeito humano; não é respeito nem é humano; o seu nome é cobardia; é atentado contra a personalidade de cada um. Trata-se de afirmar a nossa liberdade com "unhas e dentes" e com amor, sem nos tornarmos antipáticos.

Alheio a qualquer género de autoritarismo, defendia a liberdade dos outros, em todos os temas que Deus deixou à discussão dos homens, nas questões temporais; mas quando se trata de assuntos de moral e costumes não podemos ceder e devemos seguir a doutrina da Igreja que para tanto recebeu missão do Seu Divino Fundador. (Cfr. Josemaría Escrivá, Sulco, n.353 e seguintes).

E insiste na liberdade: "Com liberdade, e de acordo com os teus gostos ou qualidades, toma parte activa e eficaz nas rectas associações oficiais ou privadas do teu país, com uma participação cheia de sentido cristão: essas organizações nunca são indiferentes para o bem temporal e eterno dos homens." (Josemaría Escrivá, Forja, n.717).

Considera que os cristãos devem gozar da mais ampla liberdade quando se trata de estudar e levar à prática as diversas soluções, dentro dum correcto e são pluralismo, mas hão-de coincidir no mesmo afã de servir a humanidade. (Cfr. Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n.167).

Várias vezes quando se encontrava com pessoas não católicas disse que respeitava a crença delas e estava disposto a dar a vida pela sua liberdade religiosa.

Com o reconhecimento do milagre, obtido pela intercessão do Beato Josemaría, avizinha-se a sua Canonização que virá confirmar, de modo muito especial, a riqueza dos ensinamentos que transmitiu e viveu. É mesmo lícito pensar num futuro que só Deus conhece venha a ser considerado um dos grandes Doutores da Igreja.